Custo logístico do Brasil deve chegar a 15,5% do PIB em 2025

Primeira reportagem da série exclusiva sobre o custo logístico no país expõe uma falha estrutural acumulada por décadas

Custo logístico do Brasil deve chegar a 15,5% do PIB em 2025

O custo logístico do Brasil deve atingir 15,5% do PIB em 2025, praticamente repetindo o índice de 2024 (15,6%). O número, apresentado pelo sócio-diretor do ILOS, Maurício Lima, para o Valor Econômico, mostrou uma trajetória de alta que se consolidou ao longo da última década. Em 2014, o indicador era de 10,4% do PIB. Desde então, mesmo com oscilações na economia, a relação entre custo logístico e atividade nacional permanece elevada.

Nesse período, o país passou a transportar 25% mais carga, mas sem ampliar a infraestrutura no mesmo ritmo. Em 2025, a expectativa é que o Brasil atinja um recorde histórico de movimentação, chegando a 2,1 trilhões de toneladas-quilômetro útil (TKU), volume 2,6% superior ao de 2024.

A dimensão dessa conta fica mais clara quando comparada ao desempenho de outras economias no pós-pandemia. Nos Estados Unidos, os custos logísticos alcançaram US$ 2,58 trilhões em 2024, equivalentes a 8,8% do PIB, segundo o relatório State of Logistics”, produzido pela consultoria Kearney para o CSCMP. Mesmo acima dos níveis pré-pandemia, o percentual permanece abaixo do brasileiro.

A China registrou queda de 14,4% para 14,1% do PIB em 2024, conforme a Federação Chinesa de Logística e Compras, em dados divulgados pelo Longbridge News. No México, o custo logístico representa 13,7% do PIB. Já a Índia, segundo declaração do ministro Nitin Gadkari publicada pelo Times of India, trabalha para reduzir o indicador para 9%.

Projeções internacionais também ajudam a dimensionar o peso da logística na economia global. O relatório “How Big is the Logistics Market?”, da CargoSon, estima que o mercado mundial de logística movimentou US$ 9,41 trilhões em 2023 e deve chegar a US$ 14,39 trilhões até 2029. Os percentuais variam entre países, indo de cerca de 3,8% do PIB no Japão até 14,6% em regiões da África. Mesmo nesse espectro amplo, o Brasil permanece entre os níveis mais elevados.

Para o professor e coordenador do Núcleo de Infraestrutura, Supply Chain e Logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, as raízes estruturais dos custos logísticos no Brasil estão ligadas a falhas históricas de investimento em infraestrutura, especialmente nos modais responsáveis pelo transporte de longa distância.

De acordo com Resende, essa pressão se reflete diretamente nas empresas embarcadoras, já que o transporte de longa distância — seja de matéria-prima ou de produto acabado — responde por cerca de 42% do custo logístico total dessas companhias. É um percentual elevado que evidencia como a dependência dos modais atuais encarece a operação e reduz a competitividade empresarial. “É um custo muito alto. Entre as 20 principais economias do mundo e esse é o maior custo em termos do item transportes. E o que acontece é que o baixo investimento ao longo dos séculos em infraestrutura de transportes, principalmente nos últimos 100 anos, tem cobrado seu preço agora, provocando uma deterioração muito grande na qualidade do transporte, na questão da segurança, na questão da multimodalidade, que é baixíssima”, disse.

Esse conjunto de fatores reforça, segundo o professor da FDC, a natureza estrutural dos gargalos que mantêm o custo logístico do Brasil em patamar elevado. Ele destacou ainda que a baixa capacidade estática de armazenagem — especialmente relevante para os granéis agrícolas — também contribui para intensificar os custos, já que limita o equilíbrio entre oferta, demanda e escoamento. “São esses dois itens estruturais que formam os custos logísticos do Brasil”, ressaltou.

CUSTO LOGÍSTICO DO BRASIL: O QUE PESA NA CONTA INTERNA

A decomposição dos custos logísticos brasileiros ajuda a entender essa posição. Para 2025, de acordo com dados do ILOS, os componentes estão distribuídos da seguinte forma: transporte, 8,5% do PIB; estoques, 5,3%; armazenagem, 1,0%; e custos administrativos, 0,6%. O transporte segue sendo o elemento mais significativo, mas a evolução dos estoques chama atenção pela intensidade e pela persistência.

Como explicou Resende, a estrutura do custo logístico brasileiro envolve diferentes frentes — do transporte de longa distância às operações urbanas, passando pela última milha, armazenagem, custos portuários e administrativos. Em algumas metodologias, o nível de estoques também é considerado, o que ajuda a ampliar ainda mais a complexidade dos cálculos e a percepção de peso sobre as empresas. “Nós não trabalhamos com a inserção dos custos de estocagem nas nossas análises e aqui não estou dizendo armazenagem, é o custo do estoque mesmo”, explicou. “Se nós retirarmos esse custo do estoque, que nós não trabalhamos realmente, existem custos muito difíceis de serem tratados e eu destaco aqui o custo do transporte na longa distância e o custo dessa última milha logística.”

Para o professor, a razão pela qual esses itens são tão difíceis de reduzir está associada ao fato de que dependem diretamente de infraestrutura pública, decisões de concessão e parcerias entre governos e iniciativa privada — todas condicionadas a ciclos longos de planejamento e execução. Esse cenário cria um descompasso entre as necessidades logísticas do país e a velocidade com que sua infraestrutura evolui. “Hoje, temos uma dificuldade muito grande de quebrar essas dificuldades. E aqui eu também posso inserir custos portuários, mas isso está sendo quebrado ao longo dos anos, com os portos fazendo grandes transferências e investimentos em terminais privados”, disse.

Resende afirmou que tanto o transporte de longa distância quanto a última milha são componentes que dificilmente terão redução significativa no curto prazo. Isso porque dependem de planejamentos de longo prazo que, segundo ele, o país não consegue sustentar de forma contínua.

De acordo com o professor, a troca de planos a cada ciclo eleitoral impede a continuidade de diretrizes e compromete a previsibilidade necessária para projetos estruturantes. “Cada governo que entra traz um conceito de um novo plano nacional de logística, com novas abordagens, com novos parâmetros, e isso prejudica muito o país, porque não existe continuidade nem cobrança. Então, quando você vem com um novo plano, você começa do zero, praticamente.”

Resende defendeu que o país precisa estabelecer um ambiente institucional capaz de proteger o planejamento logístico da volatilidade política, transformando-o em política de Estado — e não apenas de governo.

“É preciso que o Brasil tenha um local, um ambiente onde o planejamento de longo prazo, que se transforma não em planejamento de governo, mas em planejamento de Estado, seja protegido da volatilidade e das variações que ocorrem a cada quatro anos”, pontuou.

Na visão dele, isso não elimina a possibilidade de cada governo definir as próprias prioridades, mas essas escolhas precisam estar alinhadas a uma estratégia maior e contínua. “Isso não implica que um determinado governo não tenha suas prioridades de investimentos, mas é preciso que essas prioridades sejam a todo momento confrontadas com o que está previsto para o longo prazo”, disse.

PRESSÕES ADICIONAIS: FRETE, JUROS E MULTIMODALIDADE

O transporte vive uma dinâmica própria. De acordo com o sócio-diretor do ILOS, Maurício Lima, para o Valor Econômico, os custos das transportadoras aumentaram entre 2023 e 2024, impulsionados pelo encarecimento de ativos, enquanto não houve repasse integral para as tarifas. Em 2025, a tendência é que os preços cobrados no frete até recuem, criando uma disparidade entre a necessidade de receita do operador e a percepção de preço elevado pelo embarcador. “As despesas das empresas de transporte aumentaram entre 2023 e 2024, porque os ativos estão caros, mas não houve repasse. Este ano, aliás, os preços cobrados tendem a baixar um pouco”, disse. Para parte do setor, o risco de descontinuidade aumenta. “Isso parece uma boa notícia, mas também pode se revelar uma bomba-relógio no médio prazo”, afirmou.

Em alguns segmentos, operadores já deixaram de atuar. No setor de granéis agrícolas, que deve crescer 17% em 2025, a justificativa é simples: “A margem não viabiliza a sua atuação”.

A pressão sobre o transporte também decorre de fatores ligados à própria dinâmica produtiva do país. Para o professor Paulo Resende, mudanças na matriz de produção, a concentração dos fluxos em determinados corredores logísticos e a necessidade de manter estoques maiores em regiões distantes dos polos industriais intensificam os custos. Entre os diferentes segmentos, o agronegócio se destaca como um dos mais impactados

De acordo com ele, o maior gargalo que pressiona os custos de transporte tem a ver com as commodities agrícolas. “Elas têm uma alta dependência da rodovia, mas também não ficamos só nas commodities agrícolas. Nós podemos partir também para petro e químico, papel de celulose e finalmente dos combustíveis”, destacou.

Segundo o professor da FDC, a estrutura atual da matriz de transportes limita a eficiência desses setores, que poderiam se beneficiar de uma integração modal mais equilibrada. “Se o Brasil tivesse um tratamento multimodal, com menos dependência rodoviária e maior aproveitamento das hidrovias onde elas existem, ferrovias, uma densidade maior de oferta ferroviária, e a cabotagem, a navegação ao longo da costa, para integração desses modais, para atender a esses setores”, frisou.

INFRAESTRUTURA LIMITADA E MATRIZ QUE NÃO AVANÇA

As limitações da infraestrutura logística brasileira reforçam esse conjunto de pressões. Um relatório da OCDE apontou que o país investiu menos de 2% do PIB em infraestrutura na última década — nível abaixo da média de economias emergentes, que aplicam entre 5% e 7% do PIB, e também inferior ao padrão de países da OCDE, entre 3% e 4%. A mesma análise estima que o Brasil precisaria investir cerca de 3,7% do PIB ao ano até 2030 para reduzir sua lacuna acumulada.

Nos transportes, o quadro é ainda mais claro. Segundo levantamento da CNT, o país investiu, em média, 0,21% do PIB em transporte entre 2010 e 2021, o menor percentual entre 50 países analisados. Economias como China (5,1%), Estados Unidos (0,6%) e Alemanha (0,7%) apresentam percentuais superiores, mesmo contando com redes mais robustas.

A matriz de transporte permanece praticamente estática. Para 2025, a participação modal projetada é de 63,4% do rodoviário, seguida por 18% do ferroviário, 14,6% do aquaviário, 4,1% do dutoviário e 0,1% do aéreo. Dados são do ILOS.

Além da distribuição modal, a OCDE destaca entraves que afetam a execução e continuidade de projetos: planejamento fragmentado, baixa seletividade de obras, insegurança regulatória, riscos jurídicos e capacidade desigual de execução entre os entes públicos.

 

Fonte: Camila Lucio - Mundo Logística

Via: Agência Logística de Notícias

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